Juros abusivos e a possibilidade de revisão judicial do contrato de empréstimo ou financiamento

Segundo dados do BACEN – Banco Central do Brasil, o volume total de operações de crédito no âmbito do Sistema Financeiro Nacional alcançou o patamar de R$ 6 trilhões em junho de 2024, o que corresponde a 54,1% do PIB brasileiro, sendo que R$ 2,3 trilhões destas operações de crédito são destinadas às empresas e R$ 3,7 trilhões às famílias em geral.

O volume de crédito impressiona. Mas não é só. Ainda de acordo com o BACEN, no crédito livre concedido às famílias (considerando-se todas as modalidades disponíveis), a taxa média de juros atingiu estonteantes 51,7% a.a., o que representa quase cinco vezes a taxa básica de juros brasileira (SELIC), atualmente em 12,25% a.a.

Neste contexto, é muito frequente que surjam dúvidas acerca das taxas de juros praticadas nestes empréstimos e financiamentos, especialmente quanto a uma possível abusividade.

No Brasil, o STJ fixou entendimento de que os juros de um contrato de empréstimo ou financiamento podem ser considerados abusivos quando excederem pelo menos uma vez e meia a taxa média praticada pelo mercado na data em que o contrato foi assinado ou em que o crédito foi concedido, levando-se em consideração o tipo de crédito contratado (p. ex., financiamento imobiliário, aquisição de veículos, crédito pessoal consignado, cartão de crédito rotativo, etc.).

Quando mencionamos que o tipo de crédito contratado deve ser levado em consideração, queremos dizer que, p. ex., os juros de um contrato de financiamento imobiliário devem ser comparados exclusivamente com a taxa média praticada pelo mercado nos contratos de financiamento imobiliário, isto é, não podemos comparar os juros do financiamento imobiliário com a taxa média para financiamento automotivo, crédito pessoal consignado e assim por diante, sob pena de desnaturar a análise da abusividade.

Neste cenário, segundo o STJ, admite-se a revisão das taxas de juros fixadas no contrato desde que no caso concreto fiquem demonstradas, cumulativamente: (i) a relação de consumo entre as partes; e (ii) que a abusividade da taxa de juros coloque o consumidor em situação de desvantagem exagerada, nos termos do art. 51, § 1º, do CDC.

É sabido que as taxas de juros de empréstimos e financiamentos variam de acordo com a finalidade da operação (aquisição de imóveis, veículos, crédito pessoal, etc.), garantias eventualmente oferecidas, perfil de risco do tomador e condições macroeconômicas.

O BACEN, desde outubro/99, passou a divulgar as taxas médias praticadas pelas instituições financeiras nas operações de crédito, ponderadas segundo o volume de crédito concedido. Por conseguinte, a taxa média calculada pelo BACEN representa as forças do mercado em determinado recorte temporal.

Naturalmente, por se tratar de uma taxa média, não é obrigatório que todas as instituições financeiras concedam crédito tendo tal taxa como referência limite, pois, se assim fosse, a taxa média deixaria de ser uma média das condições praticadas pelo mercado em determinado período e passaria a ser um valor fixo, obrigatório para todas as operações de crédito, o que certamente causaria distorções na economia.

Dessarte, conforme adiantado acima, o STJ fixou o entendimento de que os juros podem ser considerados abusivos quando forem ao menos uma vez e meia superiores à taxa média praticada pelo mercado. Não obstante, o próprio STJ também tem decisões que utilizaram como parâmetro para caracterização da abusividade o fato de os juros contratuais serem superiores ao dobro6, ou até mesmo ao triplo da taxa média praticada pelo mercado. O conceito de abusividade, portanto, não é estanque e pode variar de acordo com as peculiaridades de cada caso e do entendimento do órgão julgador.

Sopese-se que as regras consolidadas pelo STJ valem apenas para a taxa de juros remuneratórios pactuada no contrato e não contemplam a taxa conhecida como CET – Custo Efetivo Total. É importante não as confundir, vez que o CET, além dos juros remuneratórios, engloba tributos, encargos e seguros incidentes sobre a operação.

Nos casos em que o Poder Judiciário reconhece a abusividade dos juros pactuados, ocorre a revisão da cláusula contratual que os fixou, com redução da taxa contratual para a taxa média praticada pelo mercado naquela modalidade específica de crédito, na data em que o contrato foi assinado (ou em que o crédito foi concedido). Vale ressaltar que existem decisões judicias que, apesar de constatarem a abusividade dos juros, reduzem a taxa contratual para uma vez e meia a taxa média praticada pelo mercado, em vez de a reduzirem para a taxa média.

Ademais, registre-se que para contratos nos quais não há taxa de juros expressamente pactuada, é possível requerer judicialmente a redução dos juros efetivamente cobrados pelo banco para a taxa média praticada pelo mercado no momento da assinatura do contrato ou da concessão do crédito, levando-se em conta o tipo do crédito em questão.

Tendo em mente os critérios explanados acima, é possível pleitear a revisão do contrato bancário em juízo, visando a redução da taxa de juros, mas, anteriormente, é preciso realizar uma análise minuciosa da avença para verificar as reais chances de êxito do processo, especialmente quando se leva em consideração a existência de custas judiciais e a potencial sucumbência em caso de derrota, para aqueles que não forem beneficiários da justiça gratuita.

#LetangAdvogados #RevisãoDeJuros #AbusividadeFinanceira #DireitoDoConsumidor #STJ #TaxaSelic #TaxaMédiaDeMercado #ContratosBancários #CDC #CustoEfetivoTotal

Deixe um comentário